Jandir Jr. <mailexpressivo@gmail.com> 24 de novembro de 2018 09:25
Para: Robnei Bonifácio <robneibonifacio@gmail.com>

Ei Rob,

Tô passando de ônibus agora pela penha. Fiquei reparando mais detidamente nos rostos que aparecem em cartazes e murais. Muitos grupos de pagode, sim, mas também rostos absolutamente estrangeiros, vindos de imagens coletadas da internet. Mulheres loiras, famílias gringas, dentes sorrindo em bocas rosadas.

Passo os olhos nas pessoas que ocupam o mesmo ônibus que eu, e não é mais tão incomum ver esses rostos estrangeiros nos cartazes. Há cabelos tingidos aqui, alisados. Calças jeans em todas, mais um detalhe na face do imperialismo estadunidense. Californianas. Há também lentes de olho, crespos presos num coque, roupas simples demais para essas peles pretas, como se para sempre estivéssemos condenados à ser o reflexo embotado do luxo, ou pior, o reflexo embotado da branquitude.

E é claro, me vem isso por ter visto ontem sua pintura. As palavras que convivem com os rostos negros dos cartazes de irajá, com a figura do tio patinhas que faz mais ricas nossas imagens. É foda, vejo você migrando do pintar imagens de cartazes e só, de figuras brancas neles, das imagens standart (o termo em inglês é digno para representar o estrangeirismo desses cartazes) para menções mais locais, mais irajaenses, mais negras. Mas… que loucura. Agora vejo que o que separa tão brutalmente pessoas brancas e negras nessas imagens em nossos bairros se faz relativo nos corpos de quem nos faz vizinhança. Que os brancos nos cartazes se fazem justificados no modo como se enfeitam os corpos aqui, e, por isso, nos conflitos internos que carregamos por sermos a imagem periferizada no que tange à humanidade. Sabe aquela frase dos reacionários, “direitos humanos para humanos direitos”? Então… levando em conta a linha de cor que separa marginais de cidadãos de bem, que separa mulheres pra casar e mulheres que são mães solo, que separa quem é fotogênico de quem não tem equipamento para se tornar uma boa imagem (ou quem sempre foi um borrão negro nas fotos, porque a kodak só fez equipamentos calibrados para a pele branca desde meados do sec. XX)… corremos atrás de qualquer mínimo de humanidade. Vivemos na branquitude.

Gostaria de ver mais os rostos das suas pinturas. É isso.

Té,