O arquivo, como tem sido mobilizado na contemporaneidade, não pode ser destacado da obsessão neoliberal de capturar a criatividade. Artistas de toda parte são ensinados a documentar documentos, o produto enfatizado sempre sobre a força da forma, especialmente na atualidade, quando o próprio ato de ser um artista foi consagrado pela instituição acadêmica na necessária forma de mestrado em artes, e até mesmo um PhD. Cada vez mais, fazer arte é saber como enquadrá-la. É claro que são muitas as noções do processo, e com elas uma longa história de resistência a essa tendência – mas, quando se trata disso, quando a concessão precisa ser redigida, ou o dossiê de performance precisa ser lido, ou o artigo precisa ser escrito para que a próxima exposição possa acontecer, é para o arquivo que se volta , e além do arquivo da obra em si, para o currículo. Um artista sem um website é uma ocorrência rara e mesmo artistas que explicitamente resistem a essas restrições normativas muitas vezes só podem fazê-lo porque têm prestígio suficiente para agirem como exceções à regra ou porque iniciaram sua prática artística em outra época, quando esses tipos de marcadores de prática não eram atuais como hoje o são (CITE Tino Seghal, também a museimificação de Lygia Clark). O resultado disso é uma tendência a monumentalizar inadvertidamente o arquivo. Nenhum artista que conheço sente que o arquivo faz jus ao seu trabalho. E, como já deve ter ficado claro, nenhum arquivo é totalmente alinhado em forma e representação. Mas o modo como um arquivo tende a funcionar importa, e é isto que está em jogo no anarquivo. De que outra maneira o trabalho que fazemos poderia ser avaliado? E como tal valor continuaria a ser incipiente além do evento presente, de modos que não sejam imediatamente consonantes com o prestígio ou mais-valia do capital mantido por nosso arquivamento infinito? São questões do anarquivo.

MANNING, Erin. FINAL_ o que as coisas fazem quando se moldam_ O caminho do anarquivo.docx. Tradução desconhecida. [s. l.]. [2019?]. Word for Windows. Cópia distribuída pela docente Gabriela Bandeira na ocasião da disciplina GAT00222 – INTERLOCUÇÕES EM ARTES / ESPAÇO E MEIO AMBIENTE A1, ministrada por ela no primeiro semestre de 2020, no bacharelado em Artes da Universidade Federal Fluminense.