Mensagem enviada ao YouTube, às 18:40h, por meio da guia ‘Enviar feedback’.

Ontem – e peço desculpa por não lembrar em que hora exata -, a página inicial do YouTube estava aberta em meu navegador, quando começou a emitir sons. Eram ruídos de atrito, como superfícies se friccionando à superfície de um microfone. Não vinham de propaganda alguma, o que seria estranho, pois, como já percebi, os anúncios na página inicial, mesmo que com play automático, têm seus áudios desabilitados.

Curioso que, após ouvir, perplexo, o som sem origem por alguns segundos, me dei conta que ele era o áudio exato do último vídeo que havia assistido no site. Chamado ‘câmera pele’, disponível em https://www.youtube.com/watch?v=hvVCrTP8_vo, mostra imagens captadas tão de perto que nada se vê além de cores bruxuleantes, com sons de cliques, respirações ofegantes, microfones sob atrito. O vídeo foi upado no site em 17 de agosto deste ano. É de uma brasileira, e imagino que sua gravação ocorreu no mesmo período; período esse de isolamento social pelo Sars-Cov-2, do aumento vertiginoso do uso de dispositivos audiovisuais, de celulares, notebooks. 

No dia 12 de setembro de 2020, a transmissão de um seminário via Zoom, no YouTube, mostrou imagens que associo a esse vídeo. Se clicar neste link, https://www.youtube.com/watch?v=Vc93uM9CX5M, vá ao seis minutos e quarenta e cinco segundos. A partir daí, uma primeira câmera nessa reunião será tapada, provavelmente com uma mão, e não simplesmente desligada. Sua ocupante começará a dizer repetidamente a frase “Não vou dizer a continuação, porque estou cansado desse lugar e quero ir para outro”. O que se seguirá é uma segunda pessoa fazendo o mesmo, tapando sua câmera manualmente e dizendo a mesma frase, seguida então por uma terceira, uma quarta, uma quinta pessoa, até que todas estarão, igualmente, com suas câmeras tapadas e sobrepondo desordenadamente suas vozes, a dizer a mesmíssima sentença.

E ainda este vídeo: https://vimeo.com/428185832, dessa vez fora do YouTube, em que uma mulher tapa a câmera de seu celular e fala por uns bons minutos, lê uma lista de compras, zomba das ideias bizarras nas letras dos Los Hermanos, especula articulações… Igualmente: disponibilizado em 11 de junho deste nosso ano. Por uma brasileira.

Sabe, eu passei os últimos dias às voltas com vídeos que meu celular gravou por acidente, dentro do meu bolso. Enquanto andava do quarto pra cozinha, do mercado para o banheiro de casa, do álcool em gel para a margarina recém-chegada da rua, envolvido por um casaco ou retirando a máscara da cara, não foi raro retomar meu celular, do bolso para minhas mãos, e ver vídeos curtos em sua galeria, quase completamente escuros, trazendo ruídos de atritos junto às buzinas ao longe, ou mesmo latidos das minhas cachorras, ou mesmo pigarros suspeitos. Os assisti com muito gosto.

Não sei se falo com você aí, que está lendo isso, que trabalha para a Google… Sei que reporto um erro do site, que erros são assunto humano, mas… tive vontade de falar com o próprio YouTube. De fato falar sobre essas imagens escuras, próximas… desses vídeos feitos de pele-lixa e fricção. Mas mais que isso: queria falar que o erro foi a coisa mais bonita que ele me deu nesses meses árduos. Sons sem vídeo, que me fizeram suspeitar que os algoritmos dele também estão como eu, passionalmente envolvidos por qualquer possibilidade de reduzir as imagens-em-movimento na vida, pelos dispositivos mais como toque que como olhos. Acho que é isso. Nossa vontade é a de câmeras que sejam toques, dedos contra nossa pele… dedos contra toda pele… Mas sei lá.

Boa noite,