Penso em fazer meus próprios avisos, como os da minha mãe; papéis pequenos com coisas escritas sobre a casa, instruções, observações dedicadas a algum espaço. Queria que meu pai tivesse escrito papéis como os que minha mãe escreve. Quem sabe assim eu não estaria tendo problemas em entender a caixa d’água, as medidas de cimento, em como retirar o ar da bomba hidráulica, querendo dar a ver meus bilhetes nesta publicação, inúteis fora do perímetro onde moro, e por isso interessantes fora do perímetro onde moro: nessa inutilidade que faz minha casa outra coisa que não minha, e esse peso dos pequenos dramas do corriqueiro, profundos por portarem a saudade, ficando menos familiares, mais públicos, maiores como outra coisa mais leve também, mas densa de outra forma.

Estou aguardando meu ônibus chegar, e ao meu lado encontrei esses tênis e pedras que fotografei, que desejei que tivessem vindo dos meus pés, no que diria que me descalcei de meus tênis e minhas pedras enquanto aguardo um ônibus para ir ao trabalho, me descalçar em meu período de trabalho, sem autorização prévia.

Estava guardando minha marmita quando ela caiu e quebrou. Uma marmita de vidro. Saí de casa com muita raiva por ter que gastar dinheiro com um almoço na rua e outra marmita de vidro. E no ônibus, sentado, movimentei de modo suave meu dedão e senti a tira do meu chinelo ceder num estalo seco, como estilhaça. Bem antes de descer do carro deixei esse chinelo onde rompeu, e andei descalço ainda por um bom período até comprar o par de sandálias com que entrei no museu para retira-las e pôr os tênis fechados que me exigem calçar e trabalhar. E agora me descalcei em meu período de trabalho, sem autorização prévia, mais essa vez. Eu já vejo trincado em seus emborrachados que até então julgava novos.

 

Priscilla disse FOI VOCÊ?! me puxando pelo braço até um bebedouro daqui do MAR em que está brotando algo.

Celio De Andrade Santos Junior:

Aeeeeee

Arrasou

Jandir Jr.:

Hahhahqhq

O///

Celio De Andrade Santos Junior:

Caraca

Diploma da UFRJ

PRA quem é periférico isso é para emoldurar e jogar na cara de geral

Kkkk

Jandir Jr.:

Hahaha. Porra, tava pensando nisso agr vindo p ca

So da gente ta nessas universidades

É foda

Celio De Andrade Santos Junior:

Sim

Arrasou

Tu deveria fazer algo com esse diploma

Uma arte

Já que você é artista

E levantar essa questão

Jandir Jr.:

Hahhaha,

Vou pensar nisdo

Celio De Andrade Santos Junior:

Sério mlk

Kkkk

Pensa só

Jandir Jr.:

É uma boa

Celio De Andrade Santos Junior:

A gente tem diploma não para a gente

Mas para os outros

Para a gente provar que é competente

Para mostrar numa empresa

Seria legal tu usar esse diploma para você

Jandir Jr.:

Nossa

Celio De Andrade Santos Junior:

E para levantar essa questão we é importante para muita gente

Tu vai representar muita gente

Jandir Jr.:

Gostei!

Vamo ver 🙂

Celio De Andrade Santos Junior:

Hahahah

Ja tô ansioso para ver

Monica Coster:

li isso num livro e lembrei de você e dos seus objetinhos

 

“Esse estranho instrumento, ainda o tenho em alguma parte, acho, não tendo nunca me resolvido a trocá-lo por dinheiro, mesmo no extremo da necessidade, pois não chegava a compreender para que poderia servir, nem mesmo a esboçar uma hipótese a esse respeito. E de tempos em tempos o tirava do meu bolso e o observava, com um olhar atônito e não diria afetuoso, pois era incapaz de afeto. Mas durante certo tempo ele me inspirou uma espécie de veneração, acho, pois tinha certeza de que não era um objeto virtuoso, mas que tinha uma função das mais específicas e que ficaria pra sempre escondida de mim. Logo, podia sondá-lo indefinidamente e sem qualquer perigo. Pois não saber nada, não é nada, não querer saber nada também não, mas não poder saber nada, saber não poder saber nada, é por aí que passa a paz, na alma do pesquisador incurioso.”

 

Jandir Jr.:

Ei, que legal! Me identifico muito c o ultimo paragrafo

 

Qr dizer, c o final do txy

 

Txt

 

Monica Coster:

Sim ♡

 

Eu lembrei daquele galho com uma porca enfiada

 

Jandir Jr.:

Nhaaaaa!!!

 

Q foda

 

Monica Coster:

É do molloy

 

Do Beckett

 

Jandir Jr.:

Ahhhhh

 

Po, ele é maravilhoso cara

 

Tava pensando em ler esse livro

 

Monica Coster:

Lê!

 

É incrível

 

Jandir Jr.:

Uhuuuu

 

A ideia de um pesquisador incurioso é maravilhosa

Minha mãe costuma espalhar bilhetes pela casa. E não raro me peguei olhando para eles como obras em arte, pensando-os como uma intervenção doméstica, ou mesmo como um texto sendo escrito onde moramos. Talvez por isso tenha guardado alguns na esperança de aplicá-los em outros contextos que os atestassem como um procedimento artístico. Já os dei por coleção uma vez, quando percebi que o que os torna especiais é sua pálida relação com esses limites que fazem meu lar, e os joguei fora. Agora juntei novamente uns bilhetes. Tive a intenção de dar-lhes a outro lugar. Mas eles só são obras estando onde estão e se dando a mim mesmo e a ninguém mais. Calmamente me despeço. A lixeira é logo ali.


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Foi no ano passado que estive sentado num dos bancos da Cinelândia. Aguardava Aline, e no chão residia uma lasca arbórea que não chegava a ser do tamanho do meu mindinho mas, ao seu lado, uma peça pequenina de metal enferrujado lhe fazia maior. Encaixadas, suas cores se faziam as mesmas, se faziam sincrônicas em seu enlace. Admirava algo de sua junção, e a deixei – agora uma só – no braço do banco que eu ocupava, o único pedestal possível a que outra pessoa fizesse uso de sua coincidência.

Aline sentou e deteve o olhar no braço do banco por algum momento. Só via sua nuca, mas seu rosto voltado se voltou a mim após pouco, reluzente e determinado em deter minha atenção em sua mão, que carregava aquela manufatura que não chegava a ser do tamanho dos nossos mindinhos, descoberta minuciosa de uma coisa que alguém fez e que estava abandonada num canto qualquer da Cinelândia, e que fui eu mesmo que fiz, mas que Aline não sabia e que eu mesmo teria esquecido se não fosse ela a ver aquilo se erguer como monumento lançando sua sombra sobre nós.

(a cordinha roxa foi amarrada depois)